A presente obra investiga a noção de gênero na obra da filósofa feminista americana Judith Butler com o intuito de buscar referências para o trabalho com pacientes que não se enquadram nas categorias sexuais e de gêneros mais comuns, mas que encontramos cotidianamente na prática clínica.
O conceito butleriano de gênero como “ato performativo” permite abordar os “gêneros não inteligíveis”, ou seja, entender quem não se enquadra numa relação de coerência entre sexo anatômico, gênero, desejo e prática sexual. Esse conceito também se torna útil na compreensão de questões sociais da atualidade, como o casamento gay, a adoção de crianças por casais homoparentais, as mudanças na estrutura de parentesco e o surgimento de novas práticas sexuais, assim como a manifestação de novas identidades – transgêneros, drag queens, drag kings e butchs.
Acompanhando o debate entre Butler e psicanalistas lacanianos acerca dos conceitos de “diferença sexual”, “simbólico” e “parentesco”, vemos suas principais críticas se dirigirem ao estruturalismo de Lévi-Strauss e à incorporação deste por Lacan. Dessa reflexão sobre o conceito de gênero e a Psicanálise é possível derivar uma postura ética e a necessidade de uma transformação social para que se incluam todas as formas de gênero na categoria de “humano”.
“Finalmente uma apresentação do pensamento de Judith Butler que não é desleal nem com a Teoria de Gênero nem com a Psicanálise. Um texto que pergunta o que é preciso mudar na Psicanálise para que ela esteja à altura do problema dos gêneros. As objeções ao essencialismo sexológico da Psicanálise podem se transformar em rotações teóricas e consequências clínicas? Sem formar uma Psicanálise butleriana nem uma mistura reconciliatória, este livro tenta responder esta insinuação. Ele se insere em uma questão maior para nossa época: qual gramática de reconhecimento poderá acolher a indeterminação dos gêneros não inteligíveis e do que Butler chama de abjeto? Se, como argumenta a Psicanálise, o gênero nos desfaz (narcisismo) e a sexualidade nos despossui (pulsão), é possível imaginar formas de vida menos dependentes de nossa paixão pela identidade. Um trabalho de grande envergadura. Fino e preciso nos argumentos, ótimo na reconstrução histórica dos conceitos e contextos. Mostra vivamente tanto a força da Psicanálise em relação à pungência da questão quanto a atualidade da crítica de gênero retomada de Stoller, de Rubin, de Benjamin, de Butler, e agora, em versão nacional, de Patrícia Porchat”.
CHRISTIAN DUNKER