“O diário, como gênero literário, não medrou nas letras jurídicas. O desempenho da função judicante, de denso cunho pessoal, as mais das vezes subordinada ao cogente sigilo dos fatos humanos, decerto que frustra, inibe e limita a autorrevelação. Sim, porque um diário é antes de tudo uma inconfidência à revelação de fatos humanos, pessoais, vivenciados pelo memorialista, na resolução heterônoma de querelas, com repercussão no mundo fenomênico…
Julgo que escrever um diário equivale a ajoelhar-se perante um confessionário. É um ato de humildade. Mais do que isso: implica persignar-se e revelar-se numa comissão coletiva. É como vencer o pudor do corpo e despir-se, equivale a vencer o pudor da alma e revelar-se…
Com Formação do Juiz: anotações de uma experiência, Lourival Serejo está num confessionário. Mas usando uma técnica mágica, inverte os papéis. Por trás do reposteiro, ele é o confessor a ouvir-se onipresente a si mesmo, ao longo de quase 30 anos, quando iniciou a carreira de juiz, nos idos de 1981. No memorial, a tríade identidade de testemunha, narrador e protagonista unifica-se na pessoa do juiz-escritor…
Mais que cortesia, há que exigir humildade do magistrado. Sim, porque humildade é continente, a cortesia é conteúdo. Daí a oportuna advertência que Lourival faz: ‘O juiz precisa ser humilde, no seu ofício como fora dele. Já vi juízes sem humildade serem humilhados pelo tempo, pelas vicissitudes da vida, que são, muitas vezes, impiedosas. A humildade é, também, uma maneira silenciosa de ser altivo, sereno. Isso é que importa ao juiz’…”.
Leomar Amorim – Desembargador Federal TRF 1ª Região; Conselheiro do CNJ