A Convenção 169 da OIT, de 1989, surge no cenário internacional com o intuito de trazer inclusão social e defesa à diversidade cultural de grupos sociais desvalidos, remanescentes e diferenciados em suas práticas culturais, sociais, econômicas e políticas que os distingam das sociedades nacionais onde inseridos. Diferente da Convenção 107, daquele próprio órgão, que continha uma carga mais paternalista e integracionista.
A grande inovação na Convenção 169 da OIT foi carregar em seu corpo o mecanismo da autoidentificação como critério, mesmo que subjetivo, fundamental para definir quais os grupos abrangidos por aquele instrumento. No entanto, um dos grupos abarcados por ela são os denominados “povos tribais”, termo que induz certa estranheza e desconfiança, no sentido de que o mesmo não carrega alta carga de eurocentrismo, trazendo o retorno da discussão sobre padrões e técnicas desenvolvidas na época do colonialismo europeu que dominou grande parte do mundo. Ainda, no contexto brasileiro, questiona-se se os terreiros de matriz africana não estariam sob o amparo daquele termo, por mais que cause certo desconforto a esses grupos sociais, ante o resgate de sua identidade com a etnia africana, pois, compreendem que o vocábulo “povos tribais” apenas reforça o estigma e o racismo científico fundado nos séculos passados.
Assim, a presente obra procura desafiar, através de ampla revisão bibliográfica e jurisprudencial, o entendimento do termo “povos tribais” no seu sentido lato sensu e de que é possível e compatível a existência de direitos humanos coletivos. No mesmo caminhar, observa-se que apenas uma política de multiculturalismo não é o suficiente para atender os anseios dos grupos de minorias nacionais, étnicas ou culturais, com a preservação de sua identidade coletiva, havendo a necessidade de uma complementação e parceria com a política da interculturalidade, instrumento presente, inclusive, em documentos jurídicos internacionais, como a Convenção Sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, a qual fará o elo de diálogo entre as diversas culturas existentes em um Estado.
Ao final do trabalho e levando em conta todo o contexto da pesquisa, conclui-se que o termo “povos tribais”, contido na Convenção 169 da OIT, abarca as atuais comunidades de terreiro de matriz africana. Retira-se isso, pelos próprios pressupostos lá inseridos, isto é: a) há nessas comunidades signos sociais, culturais e econômicos que as distingam de outros segmentos da comunidade nacional; b) elas possuem em seu seio de solidariedade uma identidade coletiva que repercute em uma regência, mesmo que parcial, pelos seus próprios costumes ou tradições e, ainda, há uma legislação infraconstitucional, no caso o Decreto 6.040/2007, que prevê algumas regulações especiais a serem aplicadas nessa coletividade; c) tendo uma identidade coletiva que identifica os indivíduos componentes das comunidades de terreiro de matriz africana, se preenche o critério fundamental da autoidentificação como definidor desse grupo social.